O debate sobre mudanças climáticas teve início, internacionalmente, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em junho de 1972, em Estocolmo, na Suécia. Nessa época, os governantes, as comunidades científicas e a população mundial desconheciam a questão em termos de modelos globais e riscos para a humanidade.  

Governantes, sociedades científicas, organizações não-governamentais e uma pequena parcela da população mundial passaram a conhecer melhor o tema, internalizado pelas esferas governamentais nacionais e internacionais, a partir da criação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas — IPCC, na esfera das Nações Unidas (ONU), em junho de 1992, no Rio de Janeiro. Essa aproximação ocorreu na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Cnumad), mais conhecida como Rio-92. A iniciativa foi do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e da Organização Meteorológica Mundial (OMM).   

Durante a Rio-92 foi assinada por 175 países a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC). Os governos que a assinaram reconheceram a mudança do clima como "uma preocupação comum da humanidade". Além de se tornarem Partes da Convenção, propuseram uma estratégia global "para proteger o sistema climático para gerações presentes e futuras" (ONU, 1992, p.4). 

Alguns fatores que aumentam a vulnerabilidade aos problemas climáticos, segundo diversas pesquisas, resultam de uma combinação de crescimento populacional, pobreza e degradação ambiental (IPCC, 2001a; McMICHAEL, 2003), sendo reconhecidos como prioridades absolutas o desenvolvimento econômico e social e a erradicação da pobreza.

 

Os potenciais impactos à saúde associados às mudanças no clima foram estimados para um cenário de risco de aquecimento menor ou igual a 2°C. Essa projeção, que pode ser considerada otimista, ainda não apresenta elementos confirmatórios de acordo com os resultados das políticas de emissões adotadas até hoje. Segundo os modelos climáticos, para o período de 2081 a 2100, o aumento da temperatura média global está estimado entre 0,3°C e 4,8°C em relação ao período de 1986 a 2005 (IPCC, 2013). Considerando as incertezas associadas às mudanças econômicas, ambientais, sociais, demográficas e geopolíticas, alguns países, incluindo áreas do território brasileiro, podem experimentar um aumento de 4°C até 7°C na temperatura, cenário que pode acarretar novas doenças e agravamento de outras (IPCC, 2014). Se as emissões dos gases de efeitos estufa continuarem nas atuais proporções, o planeta caminhará em direção a um aquecimento médio global de mais de 3°C, com 20% de chances de atingir um valor de 4°C próximo ao final desse século (World Bank, 2012).  

Entre os compromissos dos países que assinaram a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima está a responsabilidade de “promover e cooperar em pesquisas científicas, tecnológicas, técnicas e socioeconômicas, em observações rigorosas e no desenvolvimento de bancos de dados relativos ao sistema do clima”. O Brasil tem implementado algumas dessas iniciativas, como o Programa dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia em áreas estratégicas, entre elas, Mudanças Climáticas.

Em nosso país, um marco importante desse debate no setor saúde foi a realização de uma oficina sobre mudanças climáticas e saúde durante a 7ª Mostra Nacional de Experiências Bem-Sucedidas em Epidemiologia, Prevenção e Controle de Doenças (Expoepi), em novembro de 2007. No evento foram apresentados levantamentos sobre a situação de doenças sensíveis ao clima e possíveis desdobramentos, que foram se confirmando em tendências recentes de expansão de áreas de transmissão de doenças, bem como no aumento de frequência e intensidade de eventos climáticos extremos. Alguns exemplos: a seca na Amazônia, em 2005; as cheias de 2010 e 2012; o furacão Katrina, que arrasou Nova Orleans, nos Estados Unidos, em 2005; e o primeiro ciclone extratropical brasileiro, chamado Catarina, que ocorreu no litoral de Santa Catarina em 2004. Esses fenômenos podem ser descritos como sinais visíveis da crise do modelo hegemônico produtivista e energético da sociedade contemporânea e de fatores de variabilidade climática.

Do ponto de vista da relação entre saúde e ambiente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 30% dos danos à saúde estão relacionados aos fatores ambientais decorrentes de inadequação do saneamento básico (água, lixo, esgoto, drenagem), poluição atmosférica, exposição a substâncias químicas e físicas, desastres naturais, fatores biológicos (vetores, hospedeiros e reservatórios), entre outros (OMS, 2009). Essa situação é mais difícil nos países em desenvolvimento. Em 1990, os 11% dos anos de vida perdidos por morte ou incapacidades evitáveis na América Latina e Caribe foram atribuídos a problemas ambientais. Em 2005, a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) estimou que a carga de enfermidades era de 18% nos países em desenvolvimento e de 4,5% nos países desenvolvidos (Opas, 2005). Nesse sentido, as mudanças climáticas e ambientais globais podem agravar os problemas de saúde existentes, expandir áreas sob risco e populações ameaçadas. 

A mudança do clima é um dos desafios mais críticos de nosso tempo. Eventos recentes têm demonstrado, enfaticamente, a crescente fragilidade humana frente a essas transformações. Seus impactos repercutirão na agricultura, com ameaças à segurança alimentar, no aumento do nível do mar e na intensificação da erosão de zonas costeiras, aumentando a intensidade de desastres naturais, na extinção de espécies e na alteração da distribuição de doenças transmitidas por vetores (Unep, 2007).

Mudanças climáticas: desafios e caminho de união 

Áreas e temas de pesquisa sobre a relação entre clima, ambiente e saúde devem ser incentivados de forma interdisciplinar em todas as áreas do conhecimento. Para isso, deve-se identificar laboratórios e pesquisadores com experiência no assunto, bem como incentivar pesquisas inovadoras sobre temas e problemas, e que sejam consideradas prioridades pelo sistema de saúde e seus gestores nos níveis nacional, estadual e municipal. Esses estudos não podem consagrar o modelo fragmentado de geração de conhecimento, mas ao contrário, devem estimular a integração de atividades de pesquisa e serviço, fortalecendo a capacidade instalada na instituição e a conformação do Sistema Único de Saúde (SUS).

Nessa direção, foram realizadas oficinas com especialistas e representantes da sociedade civil que apontaram alguns dos principais problemas de saúde a serem enfrentados como consequência das mudanças climáticas, além de indicadores capazes de contribuir para a identificação e o planejamento de políticas públicas:

  1. Crise de escassez da água e aumento dos riscos de incidência de Doenças Relacionadas ao Saneamento Ambiental Inadequado (DRSAI), que engloba doenças de veiculação hídrica transmitidas por vetores, por falta de higiene e por contato com águas contaminadas;
  2. Poluição atmosférica, queimadas e potencialização dos efeitos sobre doenças respiratórias e cardiovasculares;
  3. Mudanças do clima, alteração de ecossistemas e expansão das áreas de transmissão de doenças relacionadas a vetores;
  4. Eventos meteorológicos e climáticos extremos e agravos gerados por impacto direto (causas externas) de ondas de calor, ciclones tropicais e extratropicais, inundações, desabamentos de encostas e secas;

Nesses casos, os eventos e ciclos climáticos estão, essencialmente, ligados aos padrões de uso do solo e da apropriação de recursos naturais. Importante destacar, ainda, que os impactos dessas mudanças sobre a saúde são extremamente diferenciados, dependendo da vulnerabilidade dos grupos populacionais e de seu modo de reação e superação.  


Foto 1) Legenda original: "Condições climáticas e determinantes sociais se combinam para causar impactos na saúde." Fonte: Organização Pan-Americana de Saúde. Proteger a saúde frente à mudança climática: avaliação da vulnerabilidade e adaptação. Brasília, DF: Opas, 2014 
Foto 2) Legenda original: "Impacto da mudança climática na água e saneamento, aumentando a vulnerabilidade das famílias." Fonte: Organização Pan-Americana de Saúde. Proteger a saúde frente à mudança climática: avaliação da vulnerabilidade e adaptação. Brasília, DF: Opas, 2014 
Foto 3) Legenda original: Uma aliança sólida com todos os interessados em direitos é essencial." Fonte: Organização Pan-Americana de Saúde." Proteger a saúde frente à mudança climática: avaliação da vulnerabilidade e adaptação. Brasília, DF: Opas, 2014

  • 2011
  • Nos dias 8 e 9 de dezembro de 2011, no Rio de Janeiro, realizou-se a oficina Eventos climáticos extremos - desastres. Objetivo: Selecionar fontes de dados meteorológicos, ambientais, sociais e de saúde que possam usados para o monitoramento de desastres climáticos, além de estratégias de participação do cidadão por meio de ferramentas de Tecnologia da Informação (TI). Inventário de dados sobre eventos climáticos extremos e efeitos sobre a saúde. 
  • Essa organização abrangeu a lista dos indicadores relacionados a cada agravo dos quatro temas, bem como detalhes de cálculo, fonte, interpretação e limitação sobre os dados disponibilizados no Observatório de Clima e Saúde.

  • 2009
  • Nos dias 19 e 20 de maio de 2009, em Brasília, realizou-se a I Oficina do Observatório de Clima e Saúde. Objetivos: Lançamento do projeto, organização de fontes de dados e discussão de mecanismos de gestão. Com representantes de IBGE; Datasus; Agência Nacional das Águas (Ana); Ministério da Saúde (MS), também com integrantes da SVS/MS e da Fiocruz/MS; Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Ministério da Ciência & Tecnologia (MCT).

  • 2007
  • atlas agua

    O Atlas Água Brasil gera diagnósticos locais e nacionais dos problemas relacionados à qualidade da água, saúde e saneamento, além de auxiliar gestores e cidadãos no entendimento da situação da água usada para consumo humano no país, estimulando o debate sobre a qualidade e a cobertura dos serviços de saneamento básico e na formulação de políticas públicas voltadas para essas questões. A integração dos dados do Atlas é inédita no Brasil.